Medo
Num mundo de insegurança,
Movido pela rede complexa do social,
Na vulnerabilidade do desconhecido,
Na desconfiança do impalpável
Na concepção de um imaginário aturdido,
Desenvolvem-se esboços de fobia
E um itinerário de ansiedade a terror,
Na articulação de crenças sem via
Elevando-se discriminação e rancor,
Complexos de inferioridade,
De rejeição a solidão,
Ciclos de pânico e depressão;
Desenvolta a agressividade
Propicia à luta e fuga
No defeso do maior medo por instinto:
A morte que não transmuta.
Acedia
Sobre os corpos estagnados
Abate-se o peso da apatia
Um amargo letargo
Que torna os seres minguados.
A recusa na partilha da alegria do mundo
Tem na nostalgia alicerce profundo,
No abafamento, na insegurança, na moleza
Reina a taciturna melancolia,
Uma tristeza que dilacera
Forçando infelicidade e angústia.
O vazio, a depressão, uma preguiça que não cessa,
Tornando o dia a prorrogação do torpor da noite.
Que pode a Diligência fazer quando cede a inocência?
Todo o desespero em clamor converge a Belphegor seu senhor.
segunda-feira, 29 de março de 2010
quarta-feira, 24 de março de 2010
segunda-feira, 22 de março de 2010
Estrada para Huelva
Que canto de solidão é este que na penumbra me aparta do vento que lá fora corre?
A dimensão aperta-se... já mal sinto a chuva, já mal vivo nesses dias de manhãs perdidas.
Já não assisto ao despontar do sol ameno que em crescendo o frio matinal vai invertendo, sereno.
Já não constato aqueles luares cheios, mais já não conheço do que a avassaladora solidão que o nada encerra.
Volvi com agravo ao antes que me consumia. Todavia, era diferente... era tão diferente.
É que... ainda que imerso nessa profunda solidão... ainda assim sentia-te... ainda que longe, ainda que em promessa, mas ainda assim, como te sentia.
Sob olhar estrelado dormitava, assobiando no silêncio e encarando aquelas enfadonhas tardes de tórrido calor e a todas aquelas rotinas cedia, aos vícios que ilusoriamente me preenchiam. O cansaço físico que ignorava, aqueles sôfregos levantares, com que do quentinho da cama saía, disposto a abarcar as rigorosas auroras matinais de Inverno... tudo isso fazia... de índole guerreira, determinada... porque tão simplesmente, assim tinha que ser.
Onde andam agora esses dias desprezados, onde continuava a respirar porque aguardava um dia melhor?
A pálida luz do dia não perfura pelas gretas das persianas, corridas em guilhotina diurna e numa simbiótica aura com os enegrecidos cortinados que cenário lúgubre encerram, para nunca mais abrirem. Nestas tardes sombrias, como se alastram esses ecos de grotesco vazio.
"Já não há forças!"
"Já não vale a pena!"
"Já nada há a fazer!"
A confusão que implode, a sonolência que consome e que ao conforto da cama me amarra, entoando esses grilhões de sangue que tão aberrantes, os dias engolem.
E assim vão vindimando, em pesada aliança com o tempo que voraz tudo devora.
Nada aqui há. O reflexo dos espelhos perturba-me. Nada neles reluz, nada ali transcende, nada ali reside. Nada mais do que sombras obscuras que a cada respirar mais transparentes ficam.
Não há mais sequer por onde olhar. Nem mais o quero sequer fazer.
É o cessar da revolta e do duelo face ao vazio que nas minhas entranhas em batalha de atrito regia. Mas até o seu alastrar agora é diminuto, pouco mais existe para consumir e o último debater da contenda sinto. "Amanhã as minhas obrigações compelem-me a acordar às 8". Esse amanhã que cedo virou ontem, resistiu a mecânicas sinalizações... o cruel relógio, 13,14,15,16 horas foi indicando, transformando o que era mais um amanhã em mais um rasgo de inexistência, um mero vaguear do ontem que se prolonga em eco de longínquo dia que passou.
Em suma, as fontes secaram perante conformação indigna. No tempo errado me deixei apresar, quando a contracção afastei e o punho alteado ergui, desafiando mundos paralelos. Tarde o fiz e ainda o não sabia... errei, ainda que sem saber onde... como eu te teria seguido e não retornado... e como teria abandonado todos os entraves que me sufocavam sem nunca olhar para trás... num tipo de partida do qual não se regressa... eu... teria sido pó espalhado pelo vento, mas sê-lo-ia ao teu lado.
Raios, eu só não precisava do teu egoísmo, não precisava de continuar a respirar sem ver o rubro sangramento do meu corpo... de tudo o resto, eu não queria essa protecção! Eu queria-te a ti, onde, quando e como tivesse de ser, trespassando quaisquer estados ou barreiras, esmagando conjunturas e evitando que a rigidez e a pressão deste mundo nos agitasse e nos atiçasse em campos opostos, minando os sentidos e a perfeição imperfeita da nossa plenitude.
Eu ter-te-ia seguido, pois agora estaria sem me sentir tão morto quanto tu e não teria derramado um enésimo do sangue cerebral, que nos gélidos espigões que lá fora se intensificam me remetem oco, vertendo encruzilhadas em sucessivos pontos de morte efectiva.
A secura deste deserto que alastra estanca as recordações do que um dia senti prometido... o toque dos teus lábios, o toque corporal, a suavidade das minhas mãos entrelaçando-se nas tuas, percorrendo cada curva tua como uma secreta investigação, misteriosa mas que os nossos olhares resolutos, fixos, calmos, tão unos assimilavam...
Aquele aconchego, aquele abraço, aquele conforto nocturno, aquela centelha de paixão que redemoinhava desde o mordiscar de orelha, ao correr do teu pescoço, àquelas puras e inocentes brincadeiras revolvendo a uma infantilidade tão doce... nada mais que pálidas fracções que deambulavam, como se ondulassem nas tranquilas ondas de beira-mar, dispersando-se...
O mar... o vento... o sol... os cheiros e os aromas, as cores que envolvem a periferia do mundo de betão e cinza que cresce e tudo consome... Oh, mas também vocês sentem de igual modo a pressão que me é comum. Quem me dera encontrar uma réstia de forças para vos fazer companhia, procurando um bosquejar último de terreno conforto, onde esta mesma ligação não seria mais do que um convergir no mundo paralelo que me absorve...
Estou só, em erosão, privando os sentidos e cada vez menos compreendendo o que lá fora decorre. E como estou cansado de observar linhas rectas e oblíquas, uma geometria desconcertante de traços, paralelas e perpendiculares numa organização tão complexa que rege a base do caos que ali impera. Não entendo porque carregam todos uma aura tão negra, porque não brilham os seus olhos... mortos, vagos, dispersos, que deambulam presos a um desconhecido agressivo que os tece em fios, manipulando-os como parcas marionetas. Estas visões bizarras, agudizam-se e é gradual a minha cisão cada vez mais profunda com o mundo que torneia as minhas formas lá fora, revirando as minhas entranhas, ferindo-as tão rudemente de tão cruel e fria forma.
Como prefiro a monotonia que me legaste a tal epíteto de macabro tom... à dor de ter perdido antes mesmo de te ter conhecido em carne. Mas a cada ténue linha de existência minha eu pude sentir-te. Compreendi-te, pertenceste-me e de igual modo fui teu e de igual modo findei: as chamas que te fizeram o corpo em cinza, de cinzento revestiram todo o meu ser. Pergunto-me tão somente se este invólucro de carne putrefacta encontrará um final semelhante ao teu... mas isso já não importa.
Nessa placa rodoviária, tingida de salpicos de sangue, do teu sangue que nessa madrugada tão vilmente verteu. Aí jazo defunto, a teu lado, retido para sempre naquele último abraço apertado, no meio da estrada, rodeados de chamas, estilhaços e corpos. Nessa mesma sepultura cujos molhados panos o rubro fluído limparam.
Mas à poeira que a nossa lápide se encontra exposta, de todo não indigna, nos continua a unir no fogo etéreo que legitima a vida.
Huelva, nunca as tuas fronteiras viram tamanha beleza... guarda-a, aconchega-a... o nada que ela vale à tua inexistência, é o tudo que fomos, sentimos, sem dúvida o tudo, para o qual vivemos.
HUELVA
15kms
2007
A dimensão aperta-se... já mal sinto a chuva, já mal vivo nesses dias de manhãs perdidas.
Já não assisto ao despontar do sol ameno que em crescendo o frio matinal vai invertendo, sereno.
Já não constato aqueles luares cheios, mais já não conheço do que a avassaladora solidão que o nada encerra.
Volvi com agravo ao antes que me consumia. Todavia, era diferente... era tão diferente.
É que... ainda que imerso nessa profunda solidão... ainda assim sentia-te... ainda que longe, ainda que em promessa, mas ainda assim, como te sentia.
Sob olhar estrelado dormitava, assobiando no silêncio e encarando aquelas enfadonhas tardes de tórrido calor e a todas aquelas rotinas cedia, aos vícios que ilusoriamente me preenchiam. O cansaço físico que ignorava, aqueles sôfregos levantares, com que do quentinho da cama saía, disposto a abarcar as rigorosas auroras matinais de Inverno... tudo isso fazia... de índole guerreira, determinada... porque tão simplesmente, assim tinha que ser.
Onde andam agora esses dias desprezados, onde continuava a respirar porque aguardava um dia melhor?
A pálida luz do dia não perfura pelas gretas das persianas, corridas em guilhotina diurna e numa simbiótica aura com os enegrecidos cortinados que cenário lúgubre encerram, para nunca mais abrirem. Nestas tardes sombrias, como se alastram esses ecos de grotesco vazio.
"Já não há forças!"
"Já não vale a pena!"
"Já nada há a fazer!"
A confusão que implode, a sonolência que consome e que ao conforto da cama me amarra, entoando esses grilhões de sangue que tão aberrantes, os dias engolem.
E assim vão vindimando, em pesada aliança com o tempo que voraz tudo devora.
Nada aqui há. O reflexo dos espelhos perturba-me. Nada neles reluz, nada ali transcende, nada ali reside. Nada mais do que sombras obscuras que a cada respirar mais transparentes ficam.
Não há mais sequer por onde olhar. Nem mais o quero sequer fazer.
É o cessar da revolta e do duelo face ao vazio que nas minhas entranhas em batalha de atrito regia. Mas até o seu alastrar agora é diminuto, pouco mais existe para consumir e o último debater da contenda sinto. "Amanhã as minhas obrigações compelem-me a acordar às 8". Esse amanhã que cedo virou ontem, resistiu a mecânicas sinalizações... o cruel relógio, 13,14,15,16 horas foi indicando, transformando o que era mais um amanhã em mais um rasgo de inexistência, um mero vaguear do ontem que se prolonga em eco de longínquo dia que passou.
Em suma, as fontes secaram perante conformação indigna. No tempo errado me deixei apresar, quando a contracção afastei e o punho alteado ergui, desafiando mundos paralelos. Tarde o fiz e ainda o não sabia... errei, ainda que sem saber onde... como eu te teria seguido e não retornado... e como teria abandonado todos os entraves que me sufocavam sem nunca olhar para trás... num tipo de partida do qual não se regressa... eu... teria sido pó espalhado pelo vento, mas sê-lo-ia ao teu lado.
Raios, eu só não precisava do teu egoísmo, não precisava de continuar a respirar sem ver o rubro sangramento do meu corpo... de tudo o resto, eu não queria essa protecção! Eu queria-te a ti, onde, quando e como tivesse de ser, trespassando quaisquer estados ou barreiras, esmagando conjunturas e evitando que a rigidez e a pressão deste mundo nos agitasse e nos atiçasse em campos opostos, minando os sentidos e a perfeição imperfeita da nossa plenitude.
Eu ter-te-ia seguido, pois agora estaria sem me sentir tão morto quanto tu e não teria derramado um enésimo do sangue cerebral, que nos gélidos espigões que lá fora se intensificam me remetem oco, vertendo encruzilhadas em sucessivos pontos de morte efectiva.
A secura deste deserto que alastra estanca as recordações do que um dia senti prometido... o toque dos teus lábios, o toque corporal, a suavidade das minhas mãos entrelaçando-se nas tuas, percorrendo cada curva tua como uma secreta investigação, misteriosa mas que os nossos olhares resolutos, fixos, calmos, tão unos assimilavam...
Aquele aconchego, aquele abraço, aquele conforto nocturno, aquela centelha de paixão que redemoinhava desde o mordiscar de orelha, ao correr do teu pescoço, àquelas puras e inocentes brincadeiras revolvendo a uma infantilidade tão doce... nada mais que pálidas fracções que deambulavam, como se ondulassem nas tranquilas ondas de beira-mar, dispersando-se...
O mar... o vento... o sol... os cheiros e os aromas, as cores que envolvem a periferia do mundo de betão e cinza que cresce e tudo consome... Oh, mas também vocês sentem de igual modo a pressão que me é comum. Quem me dera encontrar uma réstia de forças para vos fazer companhia, procurando um bosquejar último de terreno conforto, onde esta mesma ligação não seria mais do que um convergir no mundo paralelo que me absorve...
Estou só, em erosão, privando os sentidos e cada vez menos compreendendo o que lá fora decorre. E como estou cansado de observar linhas rectas e oblíquas, uma geometria desconcertante de traços, paralelas e perpendiculares numa organização tão complexa que rege a base do caos que ali impera. Não entendo porque carregam todos uma aura tão negra, porque não brilham os seus olhos... mortos, vagos, dispersos, que deambulam presos a um desconhecido agressivo que os tece em fios, manipulando-os como parcas marionetas. Estas visões bizarras, agudizam-se e é gradual a minha cisão cada vez mais profunda com o mundo que torneia as minhas formas lá fora, revirando as minhas entranhas, ferindo-as tão rudemente de tão cruel e fria forma.
Como prefiro a monotonia que me legaste a tal epíteto de macabro tom... à dor de ter perdido antes mesmo de te ter conhecido em carne. Mas a cada ténue linha de existência minha eu pude sentir-te. Compreendi-te, pertenceste-me e de igual modo fui teu e de igual modo findei: as chamas que te fizeram o corpo em cinza, de cinzento revestiram todo o meu ser. Pergunto-me tão somente se este invólucro de carne putrefacta encontrará um final semelhante ao teu... mas isso já não importa.
Nessa placa rodoviária, tingida de salpicos de sangue, do teu sangue que nessa madrugada tão vilmente verteu. Aí jazo defunto, a teu lado, retido para sempre naquele último abraço apertado, no meio da estrada, rodeados de chamas, estilhaços e corpos. Nessa mesma sepultura cujos molhados panos o rubro fluído limparam.
Mas à poeira que a nossa lápide se encontra exposta, de todo não indigna, nos continua a unir no fogo etéreo que legitima a vida.
Huelva, nunca as tuas fronteiras viram tamanha beleza... guarda-a, aconchega-a... o nada que ela vale à tua inexistência, é o tudo que fomos, sentimos, sem dúvida o tudo, para o qual vivemos.
HUELVA
15kms
2007
domingo, 21 de março de 2010
Idos de Março
Verdes anos, amadurece em flor
quem combate com ardor...
A tua sepultura não tem nome, por isso não o posso mencionar. Mas peço a todos os ouvintes que respeitem o teu nome, e a história que se vai aqui contar.
Foste feto e depois Homem, trabalhaste no campo desde o dia em que começaste a andar. Com a enxada ganhaste músculos e corpo feito. O teu pai morrera em combate deixando-te a ti, à tua mãe e à tua irmã. Um dia vieram-te recrutar, levaste a espada e o escudo do teu pai e prometeste voltar à pequena aldeia que te viu partir. Mais um soldado menos um homem.
Embarcaram-te para longe, terra distante. Disseram-te "Mata ou morre." e tu aprendeste. Tinhas por teus companheiros, compatriotas que juraram "Um por todos, todos por um!" Eras qual romano no combate sem perecer por inimigo , vibrante e flamejante tratando o escudo como amigo. Eras belo, alto revigorante. Calejado nas mãos de espada, o teu lugar era na frente de combate e oh soldado admirável era de te ver combater!! Pelejando e defendendo com honra. Sobreviveste ao primeiro, ao segundo, ao terceiro combate. De noite ofereciam-te vinho e mulheres mas tu nunca lhes tocaste. Compraste papel e pena e gostavas de escrever. Mas não escrevias palavras sanguinárias , descrevias os lugares por onde passavas, os animais e as pessoas.
A tua fama assim como a tua sobrevivência espalhou-se e já sonhavas numa morte em glória como comandante, mas demasiado cedo despertastes quem era menor que tu.
Certa noite foste surpreendido por mão amiga, entrou na tua tenda e feriu-te de espada no peito, olhos nos olhos esperava a tua partida deste mundo para o outro, por invejas desconhecidas. Morrerias assim tu, guerreiro? Sem epítetos nem odes, nem uma única ode a teu respeito. Assim surpreendido, indefeso. Desafiavas o teu inimigo de frente sem perguntas nem respostas que o tempo que te restava era curto. A vida que palpitava em ti esfumava-se e tu pensavas o que seria do teu corpo. Desfalecido não conseguias fechar os olhos para o mundo. Um bravo soldado tombara. O teu carrasco traiçoeiro escondeu o seu feito assim como o teu corpo para que não dessem jamais contigo. Fica sabendo agora que foste atirado para o rio e putrificaste comido por todos os tipos de animais, e assim mais ninguém soube de ti, nem tua mãe nem tua irmã. A vergonha caiu sobre a tua família porque todos te julgaram fugido. As gerações seguiram-se e já ninguém se lembrava de ti, ou sequer sabiam que um dia tinha existido soldado corajoso como tu. Mas uma centelha anímica perdida no tempo e no espaço, um clamor de "vinga-me" chegou até mim.
E por isso contei a tua história, bravo soldado para que ninguém se esqueça nem daqui a mil anos.
quem combate com ardor...
A tua sepultura não tem nome, por isso não o posso mencionar. Mas peço a todos os ouvintes que respeitem o teu nome, e a história que se vai aqui contar.
Foste feto e depois Homem, trabalhaste no campo desde o dia em que começaste a andar. Com a enxada ganhaste músculos e corpo feito. O teu pai morrera em combate deixando-te a ti, à tua mãe e à tua irmã. Um dia vieram-te recrutar, levaste a espada e o escudo do teu pai e prometeste voltar à pequena aldeia que te viu partir. Mais um soldado menos um homem.
Embarcaram-te para longe, terra distante. Disseram-te "Mata ou morre." e tu aprendeste. Tinhas por teus companheiros, compatriotas que juraram "Um por todos, todos por um!" Eras qual romano no combate sem perecer por inimigo , vibrante e flamejante tratando o escudo como amigo. Eras belo, alto revigorante. Calejado nas mãos de espada, o teu lugar era na frente de combate e oh soldado admirável era de te ver combater!! Pelejando e defendendo com honra. Sobreviveste ao primeiro, ao segundo, ao terceiro combate. De noite ofereciam-te vinho e mulheres mas tu nunca lhes tocaste. Compraste papel e pena e gostavas de escrever. Mas não escrevias palavras sanguinárias , descrevias os lugares por onde passavas, os animais e as pessoas.
A tua fama assim como a tua sobrevivência espalhou-se e já sonhavas numa morte em glória como comandante, mas demasiado cedo despertastes quem era menor que tu.
Certa noite foste surpreendido por mão amiga, entrou na tua tenda e feriu-te de espada no peito, olhos nos olhos esperava a tua partida deste mundo para o outro, por invejas desconhecidas. Morrerias assim tu, guerreiro? Sem epítetos nem odes, nem uma única ode a teu respeito. Assim surpreendido, indefeso. Desafiavas o teu inimigo de frente sem perguntas nem respostas que o tempo que te restava era curto. A vida que palpitava em ti esfumava-se e tu pensavas o que seria do teu corpo. Desfalecido não conseguias fechar os olhos para o mundo. Um bravo soldado tombara. O teu carrasco traiçoeiro escondeu o seu feito assim como o teu corpo para que não dessem jamais contigo. Fica sabendo agora que foste atirado para o rio e putrificaste comido por todos os tipos de animais, e assim mais ninguém soube de ti, nem tua mãe nem tua irmã. A vergonha caiu sobre a tua família porque todos te julgaram fugido. As gerações seguiram-se e já ninguém se lembrava de ti, ou sequer sabiam que um dia tinha existido soldado corajoso como tu. Mas uma centelha anímica perdida no tempo e no espaço, um clamor de "vinga-me" chegou até mim.
E por isso contei a tua história, bravo soldado para que ninguém se esqueça nem daqui a mil anos.
Vernáculo Inconsequente
Palavras inconfessadas, gritam caladas
Ferem, espadas
Correm, asas.
Palavras incompreendidas, machucadas
Ditas, confessadas
Sucumbem escondidas ao fardo do impulso.
Palavras esquecidas, no tempo perdidas
Procuram semelhante, intrigam o pronunciante, do futuro escondido.
Palavras de amor cobradas numa noite, amaldiçoadas entre receptor e emissor porque a mensagem instiga!
Palavras que morrem à fome,
Não come nem dorme, horas a fio.
Palavras deixados gelados, cansados
Pobres vitimas prometidas.
Palavras atrozes vorazes, insaciáveis pela jornada iniciática continuam falseando aos corações,
Mentiras jazidas.
As palavras são doces, as palavras são cruéis. São à prova de bala e ferem nossa pele,
Mas a palavra dita não volta atrás, o universo a devolve em ciclos infernais! Jogando com nossas mentes o insano inconsequente, imolador do escrito em linhas de papel.
sábado, 20 de março de 2010
O Último Homem
Neste dia eu caminhei,
Até ao café gizei percurso…
E ali como combinado a encontrei.
Ela sempre tem aquele rosto alegre, quente, terno…
Meigo, de incondicional afecto, onde ferve inebriado alento.
Sorri-lhe, em contagiado aspecto… efémero,
Pois adentro, ele isolado reside do solo ao tecto.
Esta noite, um amigo reencontrei…
Abraço fraterno logo logrei…
Enquanto homens se requerem as palmadas nas costas,
Brusco contacto de amistoso trato…
Olhei-o de soslaio, soerguendo hoje duas infâncias repostas.
E ali nos reconhecemos em múltiplas propostas e respostas
E como nos rimos entre tantas palavras em sintonia dispostas…
Como nos é hoje o alheio patético.
Neste dia laborei,
Fui polido, cordial, exemplar e no possível ético,
E ainda assim creio que por poucos querido,
No entroncamento de um esforço colectivo épico.
Como poético foi o findar de contrariada rotina!
Esta noite saímos…
Como bebemos, como fumámos e aliviados nos sentimos,
E como nos reconfortámos e rimos,
Entregues a um clamar uníssono de embriaguez,
Remetendo o problemático quotidiano em surdez…
Esta noite fomos guerrilha, de ébrios a resolutos aturdidos.
No dia e na noite tornei a sorrir…
Como foi bom saltar no concerto, pular e no inaudível berrar!
Gritei, cantei, por entre uma paridade colectiva,
Por momentos nem bolha alheia defrontei…
E como foi na praia a folia do grupo activa,
Isenta de qualquer manifestação coerciva…
Dançámos e uma fogueira evocámos nesta noite de beira-mar furtiva.
E de noite em dia e de dia em noite sorrimos,
Gesticulamos, discutimos e rimos, como nos rimos…
Mas no término de mais um dia,
Em madrugadora noite de Inverno, eu chorei,
E como chorei enquanto no espelho me fitei…
Esta noite os meus olhos estão diferentes e tão iguais às noites anteriores,
Observei toda esta nova transformação facial,
Tão própria deste último Homem…
Nesta noite solitária subsequente na rotina diária,
Enfrentei-o no espelho, sob fluido lacrimal,
Aquele Eu, o último Eu, residente no fundo de mim,
Alheado do sociológico e como tal aos demais ilógico.
Nesta noite de último Homem coloquei em casa todos os outros rostos de lado,
Todos os rostos que ao mundo mostrei…
Tão longe de todos, tão dentro de mim,
Este último Eu hoje enfrentei,
Os meus olhos vibraram num diferente e obscuro assombramento,
Penetraram-no, de céptico a hermenêutico,
Penetraram-se conscientes de o ver ali, naquele momento…
O mais ascético de todos, envolto num halo de tormento…
Esta noite, o último Homem é cheio de lamento.
Até ao café gizei percurso…
E ali como combinado a encontrei.
Ela sempre tem aquele rosto alegre, quente, terno…
Meigo, de incondicional afecto, onde ferve inebriado alento.
Sorri-lhe, em contagiado aspecto… efémero,
Pois adentro, ele isolado reside do solo ao tecto.
Esta noite, um amigo reencontrei…
Abraço fraterno logo logrei…
Enquanto homens se requerem as palmadas nas costas,
Brusco contacto de amistoso trato…
Olhei-o de soslaio, soerguendo hoje duas infâncias repostas.
E ali nos reconhecemos em múltiplas propostas e respostas
E como nos rimos entre tantas palavras em sintonia dispostas…
Como nos é hoje o alheio patético.
Neste dia laborei,
Fui polido, cordial, exemplar e no possível ético,
E ainda assim creio que por poucos querido,
No entroncamento de um esforço colectivo épico.
Como poético foi o findar de contrariada rotina!
Esta noite saímos…
Como bebemos, como fumámos e aliviados nos sentimos,
E como nos reconfortámos e rimos,
Entregues a um clamar uníssono de embriaguez,
Remetendo o problemático quotidiano em surdez…
Esta noite fomos guerrilha, de ébrios a resolutos aturdidos.
No dia e na noite tornei a sorrir…
Como foi bom saltar no concerto, pular e no inaudível berrar!
Gritei, cantei, por entre uma paridade colectiva,
Por momentos nem bolha alheia defrontei…
E como foi na praia a folia do grupo activa,
Isenta de qualquer manifestação coerciva…
Dançámos e uma fogueira evocámos nesta noite de beira-mar furtiva.
E de noite em dia e de dia em noite sorrimos,
Gesticulamos, discutimos e rimos, como nos rimos…
Mas no término de mais um dia,
Em madrugadora noite de Inverno, eu chorei,
E como chorei enquanto no espelho me fitei…
Esta noite os meus olhos estão diferentes e tão iguais às noites anteriores,
Observei toda esta nova transformação facial,
Tão própria deste último Homem…
Nesta noite solitária subsequente na rotina diária,
Enfrentei-o no espelho, sob fluido lacrimal,
Aquele Eu, o último Eu, residente no fundo de mim,
Alheado do sociológico e como tal aos demais ilógico.
Nesta noite de último Homem coloquei em casa todos os outros rostos de lado,
Todos os rostos que ao mundo mostrei…
Tão longe de todos, tão dentro de mim,
Este último Eu hoje enfrentei,
Os meus olhos vibraram num diferente e obscuro assombramento,
Penetraram-no, de céptico a hermenêutico,
Penetraram-se conscientes de o ver ali, naquele momento…
O mais ascético de todos, envolto num halo de tormento…
Esta noite, o último Homem é cheio de lamento.
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